quarta-feira, 30 de maio de 2012

Zé do Trator conta a saga de sua vida no campo e na cidade

Aos 69 anos, Zé do Trator é especialista
em máquinas agrícolas de tração
Rômulo Estânrley
Repórter

Em matéria de máquinas agrícolas de tração ninguém entende melhor do que Zé do Trator, de 69 anos. Trata-se de uma figura que transita entre os dois mundos da simplória Macaíba – o rural e o urbano.

Nascido na propriedade de Jundiaí, em Macaíba, no dia 12 de outubro de 1943, José Rodrigues da Silva é filho de Edgar Simplício e Júlia Januário Gomes, falecida em 2000. São seus irmãos: Venício, Lúcia (in memoriam), Maria, Francisca, Zenaide, Eunice, Carlos e Roberto.

O menino que viria a ser conhecido como Zé do Trator cresceu nas terras da hoje denominada Escola Agrícola de Jundiaí (EAJ), em constante contato com a agricultura. Talvez por conta disso, tenha estudado até a 2ª série do primário, numa pequena escola isolada da comunidade.

Aos nove anos de idade, iniciou sua vida profissional “pastorando passarinho” no plantio de arroz do estabelecimento de ensino, a convite do então diretor Nilo de Albuquerque Melo, que conduziu a EAJ nos períodos de 1949/1950 e de 1952/1964. A direção da EAJ contratava cerca de dez crianças para dar conta de 85 hectares de plantação de arroz durante cinco meses.

Passada essa fase, foi contratado novamente, desta vez para ficar na porteira do colégio, impedindo a entrada de animais. Depois, foi trabalhar numa capinadeira, que era puxada por um boi durante o período do inverno.

O INÍCIO

A sua saga como tratorista se inicia em 12 de outubro de 1954, quando tinha apenas 11 anos de idade. José Rodrigues recorda que aprendeu o ofício de operar tratores através de Sebastião Noberto. Segundo o entrevistado, a fazenda Jundiaí era dividida em três áreas: a do Ministério da Agricultura, a do Campo Experimental Juvenal Lamartine e a da UFRN.

Zé do Trator trabalhou até os 18 anos no antigo Campo Experimental Juvenal Lamartine. Entre uma estação e outra, era designado para fazer corte de terra em várias instituições coordenadas pelo Governo do Estado. Em 1959, chegou a trabalhar no Colégio Agrícola de Ceará-Mirim, para no ano seguinte ser contratado pela Fazenda Djalma Medeiros, na Reta Tabajara, cujo gerente de lá ainda hoje é “seu” Afonso. 

Um ano depois, a Secretaria Estadual de Agricultura o requisitou novamente. O titular da pasta era João Bosco, que o designou para prestar serviços em Passagem de Areia, à empresa EIT, de propriedade de Aproniano Sá. “Eu cortava capim na seca para encher o silo e cortava a terra no inverno”, relembra.

Nesse ínterim, por volta de 1969, teve um romance conturbado com uma jovem, com quem recusou se casar. Por conta disso, viajou para Messejana/CE, onde trocou o trator por um caminhão. José Rodrigues transportava material para fabricação de bueiras que eram utilizadas para saneamento básico.

APELIDO

No início da década de 1970, no governo Cortez Pereira, foi contratado novamente pela Secretaria Estadual de Agricultura. Na ocasião, concluiu o curso de “Tratorista Agrícola” (1972), em Jundiaí, através do Programa Intensivo de Preparação de Mão-de-Obra (PIPMO), do Ministério da Educação em convênio com a Secretaria Estadual de Agricultura. O apelido de Zé do Trator foi dado pelo então diretor da EAJ, Rodolfo Helinski (1924-1992), que conduziu o colégio agrícola de 1972 a 1982. “A partir de hoje, você será conhecido como ‘Zé do Trator’”, teria dito Helinski, na entrega do certificado, a quem o entrevistado atribui a sua profissionalização.

Este não foi o único curso que José Rodrigues fez. Além de operador de máquinas agrícolas, ele também é mecânico no ramo de tratores. Em 1976, seu pai comprou um trator financiado por uma agência bancária para que José pudesse trabalhar por conta própria.

Zé do Trator era amante da boemia, mas chegou a casar por duas vezes. Ao todo, é pai de 16 filhos. É casado com Oliene Pereira Guedes da Silva, 49 anos, com quem teve os filhos José Wirteney, Márcia, Flávia, Júlia, Jonatas e Adrialyson, além das netas Wildemila e Júlia Vitória.

Profissionalmente inconstante, Zé do Trator deu um tempo na sua profissão e abriu uma sucata, em 1979, que é localizada ainda hoje por trás do Mercado Público. Paralelo a essa atividade, passou a negociar com a venda de tratores. “Sempre que alguém queria comprar um trator, me chamava para testar. E eu ganhava 10% do valor da venda”, conta.

Anos depois, em 2006, Zé do Trator voltou a fazer o que mais sabe: operar tratores. Mas, durante sua trajetória como tratorista, ele não prestou serviços somente a instituições públicas e particulares, mas também a eventos sociais e políticos.

Em 1972, por exemplo, puxou o carroção da Escola Doméstica, no desfile cívico da capital. Na campanha de 2008, operou o trator do trio do comunicador Luiz Antônio, que na ocasião trazia a então governadora Wilma de Faria com o seu candidato a prefeito Luizinho Gonzaga (PSB). No carnaval, os blocos Rasta Pé, Saco Cheio e Fefuliê, ambos de Natal; e, em 2010, o “Caranguejo do Côco”, de Santo Antônio dos Barreiros, em São Gonçalo do Amarante.

ESPERTEZA

A vida de Zé do Trator é repleta de situações inusitadas. No ano de 1977, na Fazenda São Leopoldo, em Ceará-Mirim, o proprietário havia colocado um trator à venda por 20 mil cruzeiros, que se encontrava quebrado, por estar desiludido com o seu concerto. Até um mecânico especializado foi enviado pela Ford com a missão de fazer o maquinário funcionar. O mecânico, que passou cinco dias na fazenda, levou uma nota preta, mas de nada adiantou, pois o trator continuou “no prego”.

Ao saber do anúncio da venda, Zé do Trator se dirigiu para Ceará-Mirim a fim de comprar a máquina de tração. Com a barba a ser feita e roupas simples, foi abordado pelo gerente da fazenda, que o perguntou se ele iria cortar cana-de-açúcar. “Não! Vim comprar o trator que o senhor tem para vender”, respondeu o experiente tratorista.

Um funcionário de nome Miguel foi quem mostrou o equipamento para Zé do Trator, alertando-o que não tinha freios, sendo retrucado em seguida: “Tem, sim, que eu estou sentado em cima dele”. Ao examinar o produto, Zé, com sua experiência, conseguiu colocá-lo para funcionar. Em seguida, se dirigiu para o dono da máquina e perguntou se havia um desconto na venda. “Não tiro um centavo e nem vendo fiado”, teria respondido o dono.

Então, Zé do Trator puxou o dinheiro e comprou. O fazendeiro indagou quando ele levaria o trator e Zé disse que seria naquele momento.

Ao ver o trator funcionando, o proprietário da fazenda percebeu que havia feito um péssimo negócio, pois desfez de um equipamento por apenas 30% do seu valor de mercado. “O senhor veio de onde? Do inferno, foi?”, indagou a Zé do Trator, que ousadamente respondeu: “Não! Vim de Jundiaí”.

Prestes a se aposentar, após 58 anos como tratorista, Zé do Trator se submeteu a duas cirurgias no coração (cateterismo e angioplastia), no último dia 27 de abril. Mas pretende continuar na ativa.

Nenhum comentário:

Postar um comentário